Atividade que já foi
representativa na economia do Estado hoje quase não existe
Ilhota - A
cana-de-açúcar, que já representou importante filão na economia estadual, hoje
é apenas uma atividade residual. Em 1980, o setor participava com 18,4% na
pauta de exportações do Estado. Dez anos depois, no entanto, essa parcela era
de apenas 0,4%. A concorrência dos produtores do Sudeste e Nordeste representou
o fim da atividade em Santa Catarina. Enquanto durou, porém, a atividade
representou uma página importante da história econômica catarinense. Era o ano
de 1948. O pequeno povoado da Pedra de Amolar, no município de Ilhota, Médio
Vale do Itajaí, viu chegar a fábrica Usati que transformava a cana-de-açúcar em
um produto refinado. Um verdadeiro milagre para os habitantes do local,
acostumados naquele tempo ao açúcar ainda bruto, escurecido, conhecido como
mascavo. "Não esqueço o dia em que meu pai trouxe pela primeira vez o
açúcar", conta o aposentado Félix Couto, à época com 12 anos. Coincidência
ou não, desde então toda a sua vida acabou ligada ao processo de fabricação de
açúcar. Primeiro trabalhou na lavoura de cana, para em seguida ingressar na
Usati, onde ficou de 1954 a 1989, quando se aposentou. Couto cresceu dentro da
empresa, acompanhou todos os seus passos, desde a fundação até a venda para o
grupo paulista Cosan, em 2002, quando já não mais trabalhava lá. Hoje, é o mais
antigo ex-funcionário ainda vivo da firma, que fechou as portas este mês.
"Fiquei muito triste quando soube da notícia", lamenta ele
referindo-se à decisão dos novos controladores da Usati, que optaram por
encerrar as operações da quase centenária usina catarinense. A história da
Usati começou no início do século passado, quando dois empresários, um catarinense
e outro paulista, resolveram montar uma refinaria de açúcar no vale do rio
Tijucas, onde é hoje o município de São João Batista. A atividade foi um
sucesso e eles procuraram de outro lugar para nova refinaria. Propuseram
negócio aos donos de um engenho, da família Konder Bornhausen, que funcionava
na Pedra de Amolar. Fechado o acordo, deslocaram para o vilarejo às margens do
Itajaí-açu as duas unidades beneficiadoras do grupo, centralizando ali toda a
produção de açúcar. Nascia a Usina Adelaide e Tijucas (Usati) - fusão dos nomes
Adelaide (Konder Bornhausen), do antigo engenho, e Tijucas, da refinadora
montada pelos Gomes. Lançando a marca Portobello no mercado, a Usati tornou-se
líder no segmento, a maior refinadora do Sul do País, produzindo em seu auge
quase meio milhão de toneladas de açúcar por ano.
Nos primórdios, usina transformou vida da região de Ilhota
A Usati transformou a vida do
pequeno povoado às margens do rio Itajaí-açu. Com a companhia vieram empregos,
gente nova, estrada, escola, campo de futebol, posto de saúde, armazém, boteco,
farmácia, salão de beleza, casas e outras pequenas empresas. Enfim, o progresso
se instalou no bucólico vilarejo, cravado em plena mata atlântica. "Isso
aqui era tudo mata virgem quando eu era mais jovem", conta Felício José
Bittencourt, 85 anos, o mais antigo morador da Pedra de Amolar. "Quando
veio a usina o que ainda tinha de mato foi derrubado pra fazer lenha e plantar
cana", lembra ele, neto de Geraldino Joaquim Bittencourt, tido como o
primeiro morador estabelecido no local, em 1870. O próprio Bittencourt ajudou a
devorar a floresta, derrubando árvores para vender à Usati a lenha que aquecia
suas caldeiras. Arrependido, entristeceu-se com o fim da selva e a ela passou a
dedicar alguns dos poemas que escreve desde os 40 anos. Descendente de
migrantes franceses, lembra que na infância moravam na localidade menos de uma
dezena de famílias. "As terras de cada uma iam a perder de vista. Era tudo
mato, que se derrubava pra fazer lavoura de milho, feijão, mandioca, cana,
arroz". Hoje, a população do vilarejo é de aproximadamente mil pessoas. Na
primeira metade do século passado começaram a surgir pequenos engenhos e
alambiques na região, produzindo de forma artesanal farinha, cachaça, arroz e
açúcar, sem refino. Com a chegada da Usati, o processo se acelerou, e o cenário
mudou rapidamente. O que restava da floresta foi ao chão para dar lugar aos
milhares e milhares de hectares ocupados pelas lavouras de cana, que forneciam
a matéria prima da usina. De um dos pontos mais altos do vilarejo, onde está
hoje o sindicato dos ex-trabalhadores, era possível perder de vista as
plantações. No entorno da fábrica, formou-se a vila, cuja população aumentou
cem vezes com a vinda da Usati. Nos anos 90, entretanto, a capacidade produtiva
do solo se esgotou, a cana ficou cara demais e a Usati resolveu fechar o setor
de usinagem. Passou a compra açúcar bruto de outras usinas e manteve apenas o
refino. "Foi quando a Pedra de Amolar viveu seu primeiro período de
decadência e o ciclo da cana chegou ao fim", esclarece Jorge João Pereira,
presidente do sindicato dos trabalhadores nas indústrias de alimento da região.
Desativação da Usati marca fim de ciclo - Usina
de açúcar da região de Ilhota atingiu auge nos anos 80, mas não conseguiu superar
crise
Ilhota - Com incentivos do
governo, a Usati atingiu seu auge produtivo nos anos 80, através das
exportações. Mergulhado em lucros elevados, o grupo Portobello decidiu expandir
os negócios, investindo na produção de cerâmica, construção civil e cultivo de
maçã. Na década de 90, porém, com o fim do ciclo da cana e as dificuldades do
mercado, a usina de açúcar balançou e precisou de uma parceria com a empresa
suíça Glincore, que adquiriu 51% do negócio. Em 2004, mais uma mudança de
controle acionário colocou a Usati na mão do grupo paulista Cosan S/A, um dos
mais fortes do ramo no País. Por fim, em julho deste ano, ocorreu o último ato
da saga açucareira iniciada pelos irmãos Gomes há quase 100 anos. Depois de
voltar 95% da produção da Usati para o mercado externo, a Cosan decidiu baixar
as portas da unidade, alegando que o baixo valor do dólar inviabilizou a
operação. "Fomos pegos totalmente de surpresa. Tínhamos acabado de
negociar um bom reajuste na data-base, a empresa estava investindo. Foi um choque,
a vila parou perplexa", descreve o presidente do sindicato dos
trabalhadores, Jorge João Pereira. O número de desempregados, segundo ele, foi
de 237. Parte deste contingente, acredita, pode conseguir vaga na emergente
indústria naval de Itajaí e Navegantes. "Quem sai da Usati tem ótimas referências
no mercado", conclui. Pereira observa ainda que existem rumores
extra-oficiais de que parte dos empregos poderia ser mantida se a empresa
continuar embarcando contêineres no porto de Itajaí. "Neste caso eles
manteriam um depósito no local, gerando algumas vagas. Nada comparável ao que
era, obviamente". A direção da Cosan foi procurada para confirmar a
informação, mas não se manifestou. Atualmente restam na região de Ilhota e Luiz Alves cerca de 300 hectares de
plantações de cana - uma fração perto do que já houve. Elas abastecem a
produção de cachaça e uma pequena parte se transforma em produtos artesanais,
como o melado. No total somente 12 produtores ainda investem no cultivo.
"Neste momento não há nenhuma perspectiva de aumento da área
plantada", avalia o presidente do sindicato dos produtores rurais de Luiz
Alves, Ademir Francisco Rosa da Silva. A maioria das propriedade da região
agora investe no plantio de arroz e na criação de gado. A Prefeitura de Ilhota
também acusou o golpe. Afinal, de cada sete reais que entravam no caixa
municipal todos os meses, um vinha da Usati. "A alternativa para repor a
perda de arrecadação é investir e incrementar a industria de lingerie e linha
praia, que agora é a maior fonte de arrecadação do município" avalia o
prefeito Ademar Felisky.
Diversificação reduz impacto
Criciúma - O fim do ciclo da
cana-de-açúcar em Santa Catarina só não provocou uma crise generalizada na
região de Ilhota e Tijucas, devido diversificação das atividades econômicas a
partir dos anos 80, quando os negócios da Usati entraram em declínio. A opinião
é do professor de economia da Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc)
Alcides Goularti Filho, doutor em economia pela Unicamp, de Campinas (SP) e autor
do livro "Formação Econômica de Santa Catarina" (Editora Cidade
Futura/2002). A obra de Goularti Filho mostra que em sua grande fase, o ciclo
da cana-de-açúcar no Estado, nos anos 60, contava com mais de 35 mil hectares
de áreas plantadas. O professor de economia da Unesc avalia que uma das
principais causas do declínio da produção da cana-de-açúcar em Santa Catarina
se deu em virtude da concorrência da indústria paulista e nordestina. "Com
o Proálcool - programa do governo federal para incentivar a produção de álcool
para consumo como combustível de automóveis - as usinas paulistas e nordestinas
passaram por grandes processos de modernização e a concorrência ficou
brutal", comenta. Segundo ele, a Portobello, no setor cerâmico, a
indústria calçadista em São João Batista, e o turismo religioso em Nova Trento,
impediram que a região vivenciasse uma crise econômica e social.
Atividade ainda é forte em Joinville - Produção vai para
fábricas de cachaça e melado
Joinville - Com 2.800 hectares
de área cultivada em dezenas de pequenas propriedades rurais, a cana-de-açúcar
continua sendo uma das principais atividades do meio rural joinvilense. Cerca
de 80% da lavoura canavieira é absorvida por 12 engenhos de cachaça e 40
unidades de melado, em sua maioria estão instaladas no distrito de Pirabeiraba
- principal reduto agrícola do município. O restante da produção é destinada ao
abastecimento de garapeiras e na alimentação de animais domésticos. No passado a cana-de-açúcar teve importância mais significativa, tendo se
constituído no primeiro ciclo econômico do meio rural joinvilense. A atividade
canavieira ganhou grande impulso através da Usina de Acúcar Pirabeiraba, que
começou a ser implantada na fazenda Poço do Curtume, na região de Estrada da
Ilha, nove anos após a chegada dos primeiros imigrantes europeus à então
Colônia Dona Francisca. O empreendimento pertenceu do duque D'Aumale, parente
do príncipe de Joinville, que iniciou a instalação da usina em 1860,
tornando-se sete anos depois em ponto de referência do setor agroindustrial da
colônia Dona Francisca. Segundo a historiadora Odete Schmalz, em 1867 a fábrica do duque ganhou
equipamentos que permitiam a destilação da cana-de-açúcar através de processo a
vapor. Na época, com 53 empregados, a fábrica que operava na produção de
cachaça era considerada a maior empresa rural em toda a região do litoral Norte
catarinense. Em 1876 João Paulo Schmalz foi nomeado administrador da empresa,
função que exerceu durante 38 anos, durante os quais modernizou os equipamentos
para produzir também açúcar branco refinado, que abastecia o mercado de
Joinville e de outros centros urbanos de Santa Catarina, Rio Grande do Sul,
Paraná e Rio de Janeiro. Ao escrever a monografia "Um Ducado Francês em
Terras Principescas de Santa Catarina", Odete Schmalz deixou registrado
que "o rigoroso controle em todas as fases de produção, avançada
tecnologia, mão-de-obra pessoal altamente diversificada garantem à fábrica do
duque D'aumale uma posição de destaque na indústria da colônia Dona Francisca.
A usina pertenceu ao duque até seu falecimento em 1897. Os herdeiros mantiveram
e empresa sob controle da família até 1921, ano em que se desativaram do
negócio. Atualmente uma edificação que sobrou da usina está dentro de uma área
de 270.200 m2 pertencente à empresa paulista Set Engenharia, que estruturou e
transformou o local em condomínio de chácaras rurais. Pirabeiraba teve uma segunda fábrica de açúcar - a Usina Santa Catarina -, que
foi instalada no começo da década de 1970 pelo empresário paulista Arnaldo
Ribeiro Pinto. Em 1982 a Usina Santa Catarina, foi vendida ao grupo paranaense
liderado por Serafin Meneghel, que transferiu os equipamentos para o Mato
Grosso e na fazenda, de 2.800 hectares hoje são mantidos dois mil bovinos de
corte. "A usina foi desativada porque o clima da região não é favorável à
produção de açúcar em grande escala", assinala o agrônomo Marcus Justus
Fontes.
Atividade artesanal
Joinville - Com uma produção
anual de aproximadamente 15 mil toneladas de matéria prima, o setor canavieiro
joinvilense gera trabalho e renda em dezenas de propriedades, que mantém a
atividade sustentadas pela indústria artesanal da cachaça e do melado. Na visão de Nélson Holz, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Joinville, o que efetivamente acabou em Santa Catarina foi o ciclo de produção
de açúcar refinado. "Com o
fechamento das grandes usinas, os canaviais diminuiram drasticamente, mas não
vão acabar enquanto houver produção de cachaça e melado, duas atividades
tradicionais em centenas de pequenas propriedades rurais de diversas regiões do
Estado", diz o sindicalista joinvilense. Para produzir cachaça artesanal,
a garapa é fermentada pelo período de 24 horas, passando em seguida pelo
processo de destilação em alambique, de onde sai uma bebida de grande aceitação
popular. Já o melado é feito de garapa fresca e fica pronto depois de sete
horas de fervura em tacho de cobre. Cachaça e melado são os dois produtos
artesanais mais famosos do interior de Joinville que ajudaram a consolidar o
projeto de turismo rural implantado no município no começo dos anos 90.
FONTE: Jornal A Notícia – Joinville -
24/07/2005
Boa tarde! Eu sou repórter do jornal O Município e eu queria conversar com você para uma reportagem sobre a Usati. Seria possível?
ResponderExcluirObrigado pela lembrança, mas não teria muito a acrescentar. A fonte desta postagem é do jornal A Notícia de Joinville. Eu cheguei a tratar sobre a Usati no meu TCC sendo que neste blog tem um artigo do referido trabalho. Pode usar se quiser e for útil.
ResponderExcluirhttps://professordegeografiaatual.blogspot.com/2012/06/modernizacao-economica-no-municipio-de.html?m=1
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