sábado, 17 de março de 2012

Capitalismo sem capitalistas

Por Roberto Amaral Cientista político e ex-ministro da Ciência e Tecnologia entre 2003 e 2004.

Não sei se o mais adequado é falar de ‘desindustrialização’ ou em retorno ao primarismo’. O fato é que somos cada vez mais produtores de matérias-primas e de suas exportações dependentes para salvar a balança comercial. Dependência perigosa do ponto de vista estratégico, se pensarmos no futuro do país. E ainda mais perigosa se pensarmos no curto prazo, pois a tendência mundial, alimentada pela crise global do capitalismo é, com a queda geral da demanda, a inevitável queda dos preços das commodities (consultores de mercado internacional estimam em 10% a queda dos preços da soja, da carne, do açúcar e do café nas bolsas de mercadorias). Quando um país reconhece que está em recessão (Itália e Espanha), ou, como a China de nossos dias, anuncia que vai controlar (leia-se reduzir) seu nível de crescimento (que dos fogosos 10% de tantos anos agora é projetado em 7,5%), ele está dizendo que vai comprar menos insumos. O outro lado da moeda é o que nos diz respeito, pois sua tradução é que venderemos menos, e se venderemos menos, teremos menos receita. Tudo isso ocorre quando as chamadas grandes economias (EUA, China e Alemanha à frente) aumentam o cardápio de suas medidas protecionistas, adotam políticas comerciais agressivas (de que são alvo os ‘emergentes’, isto é, nós) e o grande irmão do Norte inunda o mercado com dólares impressos sem lastro que deságuam nos países emergentes (de novo eles), agravando a crise cambial, caso específico brasileiro. Aqui, um real artificialmente sobrevalorizado estreita as margens de nossas exportações (de manufaturados, principalmente, mas também de commodities) e arromba as portas de nosso mercado interno para as importações de produtos industrializados, numa concorrência desleal com a produção nacional. Esta sofre com os juros altos, altíssimos (os maiores do mundo) ainda embora em queda, e com problemas estruturais que deitam raiz na origem no ciclo de desenvolvimento dos anos 1950, e do modelo de industrialização tardia adotado, apoiado na importação de fábricas de baixo emprego de tecnologia ou de tecnologia ultrapassada (o bom exemplo são sempre as montadoras e suas ‘carroças’). Em outras palavras: o futuro imediato aponta para a associação dos preços mais baixos das commodities com as importações em patamar elevado, donde um saldo comercial crescentemente estreito. E não poderia ser diferente, pois nossas exportações de produtos primários superam as de manufaturados. No ano passado, informa Luiz Guilherme Gerbelli (OESP, 11/3/2012), “apenas seis grupos de produtos – minério de ferro, petróleo bruto, complexo de soja e carne, açúcar e café – representaram 47,1% do valor exportado. Em 2006, essa participação era de 28,4%”. Mas, infelizmente, esta ainda não é a verdade toda. O Brasil é o maior exportador mundial de café em grão, e a Alemanha, que não produz um só grama, é o maior exportador mundial de café solúvel; a Itália, o maior exportador de máquinas de fabricação da bebida e criador de variadas formas de seu preparo. O Brasil exporta pedras preciosas para importá-las lapidadas. Paro nesses dois exemplos escolhidos ao acaso, pois a listagem seria interminável. Na listagem de Gerbelli está o petróleo, mas o petróleo bruto! Essa esse despautério é uma das heranças do neoliberalismo e do fim de investimentos pela Petrobras no refino, política de lesa-pátria dos Fernandos só corrigida no governo Lula, com o atual programa de ampliação e construção de novas refinarias. Mas, qual a política para a era do Pré-sal? Ao contrário do que mais preocupa a imprensa ligeira e alguns governadores, a questão menos relevante é a distribuição dos royalties, em torno do qual tanto brigam. O essencial é saber se nos conformaremos em ser grandes exportadores de óleo bruto, como um Iraque, um Irã, uma ArábiaSaudita, uns Emirados Árabes. Qual será nossa política? Eis o que precisamos discutir já e com atraso. A questão que aflige a produção brasileira de manufaturados, especialmente de bens de consumo, é menos de sobrecarga fiscal e mais de política industrial, que precisa ser concebida dentro de um projeto de retomada do planejamento público. Mais Ministério do Planejamento e menos Tesouro Nacional. Não conheceremos o crescimento (com bem-estar social) de que carecemos, nem ele será sustentável se, puxada a economia pelo Estado, não investirmos pelo menos 25% do PIB. Queiram ou não os oráculos do neoliberalismo. O industrial brasileiro, que jamais conheceu o pioneirismo (Mauá, o grande símbolo de empreendedorismo, era um dependente de concessões de serviços públicos e por isso mesmo atrelado à banca do Império), ora é um associado de multinacionais, ora um rentista do BNDES, o sócio capitalista de nossos capitalistas. A regra é esta, quando se trata de empreendimento que exija alto emprego de capital, algum nível de risco ou lenta maturação, o erário entre com o capital e o empresário privado – isto é, o grande empresário – com o lucro. O orgulhoso agronegócio deve ao Banco nada menos de 13 bilhões de reais e muito mais do que isso à carteira agrícola do Banco do Brasil. Mantém uma custosa bancada de ‘deputados ruralistas’ para, além do lobby legítimo, impor à União, periodicamente, a anistia de suas dívidas. Como sempre: prejuízo socializado, lucro privatizado. O grande problema do capitalismo brasileiro é exatamente este, a ausência de capitalistas, e o que nos salva é exatamente a existência de um Estado ainda indutor do desenvolvimento (em que pese a insistente cantilena das grandes empresas de comunicação de massa). No plano industrial, o pouco ou muito que tems inexistiria se não houvesse o BNDES; no plano agrícola, nossos empresários dependem da Embrapa(investimento do Estado em pesquisa) e da carteira agrícola do BB, que vive levando beiço de seus rentistas. No plano da tecnologia e da inovação nada teríamos logrado sem o MCT, o CNPq, a Finep e as agências estaduais de fomento, como a Fapesp. Enquanto a necessidade não cria nossos capitalistas, cabe ao Estado, retomar com força seu papel desenvolvimentista controlar o câmbio, aumentar os mecanismos de proteção de nosso mercado, cujo bom sinal é a renegociação com o México do acordo de importação de veículos, aumentar os custos das importações (e para elas adotar critérios seletivos) e conservar a atual política de queda de juros. E, para maior irritação da direita impressa, acelerar o processo de distribuição de renda, que compreende o contínuo aumento dos salários em geral e do salário-mínimo de forma especial. País rico é aquele que exporta os excedentes não absorvidos pelo consumo interno, que é tanto maior quanto mais justa seja a sociedade.

www.cartacapital.com.br

sexta-feira, 16 de março de 2012

Morre Aziz Ab’Saber aos 87 anos

Aos 87 anos, o geógrafo Aziz Nacib Ab’Saber morreu na manhã desta sexta-feira 15 de março. A informação é da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da qual Ab’Saber era o presidente de honra. O pesquisador da USP marcou o desenvolvimento da geografia brasileira e sua obra tem reconhecimento internacional. As causas da morte ainda são desconhecidas. Ab’saber foi autor de publicações importantes nas áreas de ecologia, biologia evolutiva, fitogeografia, geologia, arqueologia e geografia e acumulou prêmios como o Jabuti, Prêmio Unesco pela Ciência e Meio Ambiente, o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia (1999), concedido pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e a Medalha de Grão-Cruz em Ciências da Terra pela Academia Brasileira de Ciências. Tem uma obra extensa sobre os ecossistemas brasileiros e é responsável por criar uma de suas classificações morfológicas. O geógrafo nasceu em São Luiz do Paraitinga, no interior paulista, em 24 de outubro de 1924. Filho de imigrante libanês e mães brasileira,ingressou na Faculdade de Geografia e História da Universidade de São Paulo aos 17 anos. Pouco depois, tornou-se professor universitário. Mesmo aposentado, o intelectual continou atuante. Segundo a SBPC, Aziz visistou na tarde da quinta-feira 15 a sede da instituição, que presidiu entre 1993 e 1995, e entregou um DVD com toda sua obra publicada para divulgação. Uma de suas marcas era o forte posicionamento político. Durante as discussões sobre o novo Código Florestal, fez declarações criticando o texto que, segundo ele, não considerava os diferentes climas do país. A Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP decretou luto oficial nesta sexta-feira, com suspensão das aulas. O velório ocorrerá a partir das 19h no Salão Nobre da instituição.

Homenagem
Em nota, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que “Aziz Ab’Saber foi, sem dúvida, um dos maiores geógrafos que o Brasil já teve. Seu profundo conhecimento da geografia e seu compromisso inabalável com o povo brasileiro foram fonte de inspiração para todos nós” Lula contou ter convivido “intensamente” no Instituto Cidadania, no Governo Paralelo e, sobretudo, nas Caravanas da Cidadania com o professor. “Juntos, percorremos todos os cantos do Brasil, conhecendo a diversidade do nosso país e do nosso povo. A presença do professor Aziz, com sua inteligência e sabedoria, transformou essa experiência em algo extraordinário”. Segundo o ex-presidente a presença “sempre ativa, crítica e opinativa foi fundamental e ajudou a construir muitas das políticas públicas brasileiras”. “E foi assim que ele se manteve até seus últimos momentos”. Por fim, Lula disse que “Aziz deixará muita saudade, mas o conhecimento que ele transmitiu a todos nós continuará, com toda certeza, presente em nossas ações”. “Nessa hora de tristeza prestamos nossa solidariedade a seus familiares”, encerrou.

domingo, 11 de março de 2012

Grécia: histórica reestruturação da dívida livra país de default descontrolado

BRUXELAS (AFP) – Após o acordo sobre a reestruturação da dívida grega, cuja aprovação foi anunciada na madrugada desta sexta-feira, os ministros de Finanças da Eurozona desbloquearam 35,5 bilhões de euros para a Grécia, sendo essa a primeira parte de um pacote de 130 bilhões de euros, que começará a ser entregue na próxima semana e salvará o país do default descontrolado. Estes 35,5 bilhões correspondem diretamente ao perdão parcial da dívida, destinados essencialmente a ajudar os bancos a oferecer garantias ao Banco Central Europeu (BCE), disse o titular das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäuble em uma coletiva de imprensa ante a imprensa ao término de uma coletiva telefônica do Eurogrupo.
O acordo sobre a reestruturação da dívida grega era uma condição básica para desbloquear esse segundo pacote de crédito, que totaliza 130 bilhões de euros. Como os bancos da Eurozona não podem utilizar já seus títulos da dívida grega como garantia nas operações de empréstimo do BCE, os dirigentes europeus lhes haviam prometido uma compensação financeira. O restante do pacote, 94,5 bilhões de euros, será desbloqueado provavelmente na próxima semana, disse Schäuble, “uma vez que sejam cumpridas as questões formais”. “Não superamos o problema, mas demos um passo importante”, completou o ministro. O governo da Grécia anunciou nesta sexta-feira que quase 84% de seus credores privados aceitaram a operação de troca da dívida, o que representará a perda de mais da metade dos valores dos títulos e abrirá o caminho para desbloquear os recursos necessários para salvar o país da falência. Segundo o Ministério das Finanças, os proprietários de bônus da dívida grega – donos de um montante avaliado em 172 bilhões de euros – aceitaram a troca, que corresponderá a 83,5% dos € 206 bilhões de dívida pública nas mãos de investidores privados (bancos, seguradoras e fundos de investimento). O percentual sobe a 85,8% quando considerados apenas aqueles que adquiriram títulos sob regimes do direito grego. Esta é a maior reestruturação de uma dívida da história, que supera os 82 bilhões de dólares do default da Argentina em 2002 (73 bilhões de euros com a cotação da época). Atenas destacou ainda que, devido a ampla adesão, o governo ativou as cláusulas de ação coletiva (CAC) que forçam os credores privados reticentes a aceitar a operação. Esta medida elevará o nível de adesão a 95,7%. A União Europeia (UE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) haviam condicionado ao êxito da operação – que representa um desconto de 53,5% do valor dos bônus gregos em mãos privadas – o repasse de 130 bilhões de euros para salvar o país da quebra. Esta quantia corresponde ao segundo resgate concedido à Grécia por seus sócios da Eurozona. O primeiro plano de ajuda, de 110 bilhões de euros em 2010, se revelou insuficiente para salvar um país que tem as contas abaladas e entra em 2012 no quinto ano consecutivo de recessão. Menos de 75% de adesão teria significado um fracasso da operação e deixado a Grécia exposta a um rápido default, já que o país enfrenta vencimentos por 14,4 bilhões de euros em 20 de março. As principais bolsas mundiais, o petróleo e a cotação do euro registram alta nesta sexta-feira. Na Europa, as Bolsas abriram próximas da estabilidade, depois que fecharam em alta na véspera com as notícias de um possível êxito na operação grega. O ministro das Finanças, Evangelos Venizelos, agradeceu aos investidores que se uniram à “histórica” iniciativa. “Em nome da República, quero expressar meu apreço a todos os nossos credores que apoiaram nosso ambicioso programa de reforma e ajuste, e que compartilharam os sacrifícios do povo grego neste esforço histórico”, destacou Venizelos em um comunicado. O ministro informou que o prazo para os credores que compraram títulos da dívida grega sob regimes legais estrangeiros aceitem a operação, cujo prazo foi ampliado para eles até 23 de março. Nesta categoria, apenas 69% dos investidores aderiram ao plano. Atenas tem atualmente uma dívida pública total de 350 bilhões de euros, equivalentes a 160% do Produto Interno Bruto (PIB). O conjunto de planos de ajuste, reduções da dívida e créditos deve permitir ao país reduzir a dívida a 120,5% do PIB em 2020. A aplicação das CAC permitirá superar 95% de adesão do plano, mas a adesão forçada também poderia ativar os seguros contra a falta de pagamentos (CDS), que em fevereiro alcançavam 3,2 bilhões de euros. A Alemanha, principal economia europeia, considerou que o acordo representa um “grande passo” para a estabilidade da Grécia. O Instituto Internacional de Finanças (IIF), uma associação do sistema bancário que participou na elaboração do processo, destacou que a reestruturação “dá à Grécia uma grande oportunidade de avançar com seu programa de reformas e reforça a capacidade da Eurozona de criar um ambiente de estabilidade e crescimento”. Pouco antes do anúncio oficial, a diretora gerente do FMI, Christine Lagarde, havia afirmado que a perspectiva de um acordo “afasta, no momento, o risco de uma crise”. A operação de troca será concretizada na próxima segunda-feira para os bônus de direito grego.

Fonte: www.cartacapital.com.br

Portugal National Geographic


Documentário BBC - Terra: O Poder do Planeta - Terra Rara