sábado, 30 de outubro de 2010

Floresta Amazônica

A Amazônia é a maior floresta tropical úmida do mundo com uma área aproximada de 4,5 milhões de km2 (Sioli, 1990), abrangendo no território brasileiro os estados do Amazonas, Pará, Acre, Roraima, Amapá, Rondônia, norte do Mato Grosso e oeste do Maranhão. Além do Brasil a Floresta Amazônica se estende pelos países vizinhos da Guiana, Guiana Francesa, Suriname, Venezuela, Colômbia, Equador, Bolívia e Peru.
            A Amazônia está localizada no norte da América do Sul, sendo esta região cortada pelo rio Amazonas, que nasce no Peru, na Cordilheira dos Andes e deságua no oceano Atlântico, depois de cruzar todo o norte do país, tendo aproximadamente 6.570 km de comprimento(Ab’Saber, 2005). A região abriga o sistema fluvial mais extenso e de maior massa líquida da Terra, formando a Bacia Amazônica, que tem uma área calculada em mais de 7 milhões de km2  (Sioli, 1990).
            No domínio Amazônico predominam temperaturas médias anuais de 26 a 27 ºC, ocorrendo chuvas, em geral, superiores a 1700 mm, alcançando até 3500 mm, perfazendo uma precipitação média de 2500 mm ao ano. Ligado a tais condições climáticas, baseada na associação entre calor e umidade, foi possível gerar e preservar o grande contínuo de florestas e diversidade biológica, que se estende do nordeste do Pará aos sopés dos Andes, dos arredores da Serra dos Carajás às encostas do Pico da Neblina e serras ocidentais de Roraima (Sioli, 1990).
            O fator importante para a formação e manutenção da floresta amazônica é o regime pluvial, sendo a Amazônia uma região de chuvas abundantes e bem distribuídas o ano todo, devido a sua posição geográfica de clima equatorial, quente e úmido, além da densa rede de rios, propiciando o surgimento da floresta (Sioli, 1990).
            Segundo estudos, aproximadamente a metade da água da chuva caída na Amazônia retorna, por evaporação, diretamente a atmosfera, onde novamente se condensa e volta a cair (Sioli, 1990, Apud Salati et ali).
            Mas para se entender as condições atuais da Amazônia é preciso saber como elas se originaram, qual a história geológica que condicionou esta região. Um dos fatores responsáveis pela origem da Floresta Amazônica foi o soerguimento da Cordilheira dos Andes que bloqueou o escoamento do sistema fluvial amazônico, que naquela época, corria para o oceano Pacífico (Sioli, 1990).
            Na era Paleozóica a depressão amazônica estava coberta pelo mar formando um grande golfo aberto para o pacífico onde foram deixados sedimentos marinhos de vários períodos, chegando a 3.000 metros de espessura (Sioli, 1990).
            Após, houve uma regressão marinha e durante toda a Era Mezosóica a Baixada Amazônica era terra emersa, sendo que os rios que drenavam esta região corriam para o Pacífico, correndo, o canal fluvial principal em sentido contrário ao atual (Sioli, 1990).
            Foi então na Era Cenozóica que os Andes começaram a soerguer-se, passando a bloquear o escoamento do sistema fluvial amazônico para o oceano Pacífico represando as águas fazendo com que toda a depressão amazônica transformar-se em uma paisagem alagada formada por rios e lagos, ocorrendo a partir daí a formação de toda a Baixada Amazônica com sedimentos de água doce, que atingindo até 300 metros de espessura constituem as camadas da chamada formação Barreiras ou Alter do Chão (Sioli, 1990).
            Por fim, as massas de água acabaram fluindo para leste, formando-se o atual sistema fluvial do Amazonas, que a partir de então passou a desaguar no oceano Atlântico e o solo sedimentar da paisagem anterior, gerado na água, ficou a seco, cobrindo-se com a floresta (Sioli, 1990).
            A Floresta Amazônica é, portanto, resultante da história geológica e do clima, abrigando o sistema fluvial mais extenso e de maior massa líquida da terra, sendo coberta pela maior floresta pluvial tropical. A Floresta Amazônica se desenvolveu em uma planície, cuja rede hidrográfica drena esta região através dos vários rios, que se originam tanto no planalto Central como no planalto das Guianas e também nos Andes, tributários do Rio Amazonas que deságua todo este volume d’água no oceano Atlântico. É delimitada ao norte pelo maciço das Guianas e ao sul pelo maciço do Brasil Central, a oeste pela jovem Cordilheira dos Andes, ficando aberta a leste, permitindo aí a franca entrada dos ventos alísios (Sioli, 1990).
            O relevo Amazônico apresenta uma área de planície, com atitude de até 100 metros apenas ao longo do baixo Amazonas, constituída de sedimentos recentes resultantes da deposição de aluviões transportados pelos rios. A partir do distanciamento das margens do "grande rio" até cerca de 500 metros de altitude, ocorrem às depressões, com inclinações suaves, resultantes do trabalho de erosão sobre rochas de origem cristalinas ou sedimentares. Nos extremos Norte e Sul, encontramos os planaltos das Guianas e do Brasil Central, com altitudes variando entre 500 a 900 m, formados por terrenos cristalinos, constituindo áreas onduladas, (Sioli, 1990).
            A vegetação caracteriza-se de acordo com os três níveis topográficos da Amazônia, por três diferentes matas: de igapó, várzea e terra firme. A mata de igapó corresponde à parte da floresta em que o solo se encontra inundado, tendo como exemplo a vitória-régia. A mata de várzea é própria das regiões inundadas periodicamente, denominadas terraços fluviais ou planície aluvial de 20 a 100 km de largura. As matas de terra firme se localizam na parte mais elevada do relevo amazônico, livre de inundação (Sioli, 1990).
            Quanto à formação florestal, a Amazônia parece ser uma paisagem homogênea, mas não é, sendo que podemos distinguir dois tipos, a Floresta Ombrófila Densa, com vegetação fechada, úmida devido à luz solar não chegar ao solo, estando ligada a fatores climáticos tropicais de elevadas temperaturas (médias de 25ºC) e de alta precipitação, bem distribuída durante o ano com  0 a 60 dias secos. Esta floresta está presente por toda a planície amazônica (Veloso et ali, 1991).
            Já a Floresta Ombrófila Aberta circunda a parte sul da Bacia Amazônica e ocorre em inúmeros agrupamentos separados, situados nas partes norte e leste da Floresta Amazônica, apresentando quatro faciações florísticas que alteram a fisionomia ecológica da Floresta Ombrófila Densa, sendo a floresta de palmeiras, a floresta de bambu, a floresta de sororoca e a floresta de cipó, onde as copas das árvores geralmente não ficam tão próximas umas das outras, o que permite a passagem dos raios solares imprimindo-lhe claros, além de gradientes climáticos com mais de 60 dias secos por ano (Veloso et ali, 1991).
            Os terrenos areníticos do Período Terciário são em geral revestidos por comunidades florestais, com palmeiras por toda a Amazônia e com Bambu na parte ocidental, já as comunidades com sororocas e com cipó revestem preferencialmente as depressões do embasamento pré-cambriano e encostas do relevo dissecado dos planaltos que envolvem o grande vale amazônico (Veloso et ali, 1991).
            Nos Estados do Piauí e Maranhão a floresta de palmeiras pode ser considerada como uma floresta de babaçu revestindo terrenos areníticos do Cretáceo, na bacia do Maranhão-Piauí. A floresta aberta com bambu encontra-se distribuída principalmente nos Estados do Amazonas e do Acre, sendo que o gênero Guada invadiu recentemente sobre o dobramento pré-andino do Cretáceo. A floresta de cipó, que era mais expressiva no sul do estado do Pará, principalmente nas depressões circulares do Pré-Cambriano, encontra-se distribuída por toda a Amazônia. A floresta aberta com sororoca é quase exclusiva da bacia do rio Xingu, sendo a menos representativa (Veloso et ali, 1991).

Fontes Consultadas

AB’SABER, Aziz Nacib. Os Domínios de Natureza no Brasil – Potencialidades paisagísticas. Ed. Ateliê Editorial, São Paulo, 2005.

SIOLI, H. Amazônia – Fundamentos de Ecologia da maior região de florestas tropicais. 2ª edição, Ed. Vozes, Petrópolis, 1990.

VELOSO, H. P.; RANGEL FILHO, A. L. R.; LIMA, A. J. C. Classificação da Vegetação Brasileira Adaptada a um sistema Universal. IBGE/Dpto. de Recursos Naturais e Estudos Ambientais. Rio de janeiro, 1991.

domingo, 24 de outubro de 2010

Resenha Bibliográfica: O CONCEITO DE ESPAÇO RURAL EM QUESTÃO

IDENTIFICAÇÃO DA REFERÊNCIA

Título: O conceito de espaço rural em questão
Autora: Marta Inez Medeiros Marques


RESUMO

1. Apresentação

A diminuição das desigualdades sociais passa necessariamente pela valorização do campo, mas no Brasil o que se vê é um projeto de desenvolvimento rural voltado para expansão e consolidação do agronegócio, que embora gere divisas via exportação implica custos sociais e ambientais crescentes. A estratégia de desenvolvimento do campo deve priorizar o desenvolvimento social, mas que não se restrinja a uma perspectiva econômica, aumentando ainda mais as desigualdades, como pode ser evidenciado pelo avanço dos movimentos sociais no campo. É preciso uma política eficaz de fixação do homem no campo valorizando as atividades primárias tendo em vista que a pobreza atinge 39% da população rural e sendo identificado no meio rural os menores índices de escolaridade concentrando hoje os mais baixos níveis de renda média evidenciando o descaso do governo para com o homem do campo.

2. A nossa definição oficial de espaço urbano e rural

No Brasil adota-se o critério político-administrativo e considera-se urbano toda sede de município (cidade) e distrito (vila). O espaço urbano caracteriza-se por construções, arruamentos e intensa ocupação humana, além das áreas afetadas pelo desenvolvimento urbano bem como as reservadas a expansão urbana. Além disso, o urbano e o rural são definidos pelo arbítrio dos poderes municipais influenciado por seus interesses fiscais. Veiga (2002) discorda do critério de urbanização utilizado no Brasil e sugere o uso combinado de três critérios para se evitar uma ilusão imposta pela atual norma legal: o tamanho populacional do município, sua densidade demográfica e sua localização. Desta forma, 30% da população brasileira seriam essencialmente rurais. Pra esta análise é preciso considerar a relação entre espaços mais urbanizados e espaços onde os ecossistemas permanecem menos artificializados, ou seja, espaços rurais, para a definição de uma estratégia realista. Veiga procura defender a viabilidade econômica do espaço rural como trunfo econômico desses espaços o seu patrimônio cultural e natural, além das amenidades (ar puro, belas paisagens) enfatizando o dinamismo encontrado nos países desenvolvidos preocupando-se demasiadamente este autor em transformar o espaço rural em objeto do consumo não problematizando os aspectos sociais. Alentejano analisa a urbanização do campo com base na proliferação de atividades não agrícolas neste espaço como o turismo e prestação de serviços que não deixam de ser atividades rurais tendo em vista a dependência associada à terra.

3. Sobre critérios e definições, em questão a perspectiva dicotômica

O rural e o urbano são comumente definidos a partir de suas diferenças, ou seja, sob uma perspectiva dicotômica. Os principais critérios utilizados oficialmente são:
a) discriminação a partir de um patamar populacional;
b) a predominância da atividade agrícola;
c) delimitação político-administrativa.
De uma maneira geral, as definições elaboradas sobre o campo e a cidade podem ter duas abordagens:
A dicotômica: o campo pensado como meio social distinto da cidade se referindo as características de ordem econômica, espacial, social e cultural a partir de 8 traços principais:
- atividades desenvolvidas;
- dependência da natureza;
- tamanho das populações;
- densidade populacional;
- diferenças na homogeneidade e heterogeneidade das populações;
- complexidade social;
- diferenças na mobilidade social;
- direção da migração.
E a continuum: idéia de continuum rural-urbano, ou seja, maior integração entre cidade e campo, com a modernização desde e a destruição de formas arcaicas, admite-se, pois diferenças de intensidade e não de contraste entre estes dois espaços, em relação aos quais não haveria uma distinção nítida, mas uma diversidade de níveis que vão desde a metrópole até o campo no outro extremo, que analisado atentamente também se apóia numa concepção dual, pois consideram o rural e o urbano como pontos extremos numa escala de gradação.

4. A alienação do modo de vida urbano e a idealização da ruralidade

Para Willians a cidade se tornou o símbolo do capitalismo, embora o campo também tivesse sido influenciado e as relações entre cidade e campo tivessem se transformado. Só que no tocante ao campo o homem passou a valorizá-lo a partir de sua paisagem natural, objeto do consumo dessa nova sociedade capitalista. A divisão e oposição entre cidade e campo, indústria e agricultura, em suas formas modernas, correspondem à culminação do processo de divisão e especialização do trabalho que, com o capitalismo, foi desenvolvido a um grau extraordinário. O autor nos convida a superarmos tal divisão que estaria na base do processo de alienação e nos tornaria seres divididos. A imagem idealizada do campo corresponderia, assim, a uma reação crítica a forma alienada das relações sociais dominantes.
               
5. A relação cidade-campo

Para Marx, “A oposição entre a cidade e o campo começa com a transição da barbárie a civilização, da organização tribal ao estado, da localidade a nação e persiste através de toda história da civilização até nossos dias”. Já para Lefebvre a Razão teve na cidade seu lugar de nascimento contrapondo a cidade a ruralidade e a vida camponesa cheia de forças obscuras. Segundo Lefebvre são identificadas três eras:
Era agrária: nas sociedades agrárias as cidades arcaicas eram, sobretudo cidades políticas que organizavam o meio rural sendo dominada por este. O campo produzia e a cidade consumia.
Na Idade Média Européia, o surgimento das cidades relaciona-se com as seguintes funções: cidadela ou palácio, santuário e mercado. Neste período a separação entre cidade e campo pode ser entendida como separação entre capital e propriedade da terra, o passo seguinte foi a separação entre produção e comércio. A produção agrícola deixa de ser a principal atividade e a riqueza deixa de ser sobretudo imobiliária. A cidade passa a ser o lócus da produção e a controlar o sistema da produção no campo completando a vitória da cidade sobre o campo. Os fundamentos da riqueza não mais se reduzem a propriedade da terra, mas se estende ao trabalho e a troca.
A cidade industrial passa a gerar grande concentração urbana, apresentando extensos bairros proletários e abrigando população expulsas do campo. O movimento urbano associado ao processo de industrialização é responsável pelo surgimento de novas atividades econômicas para estruturar a circulação de mercadorias e para organizar e administrar todos os sistemas relacionados as atividades econômicas.
Por outro lado, a partir do final do século XX, com a saturação da cidade, a natureza transforma-se no “gueto dos lazeres”, o espaço do campo passa a ser colonizado pelos urbanos e a integrar o modo de vida deles. Nesta perspectiva, abre-se uma discussão sobre um novo rural para que se possa repensar o urbano e neste sentido não concebendo o campo apenas como complemento da cidade, tampouco paisagem a ser consumida, mas lugar de oportunidades para o momento em que estamos vivendo com  a superpopulação das cidades e a queda da qualidade de vida, a saturação do mercado de trabalho, sendo visível através dos movimentos sociais.

6. Considerações finais

Na França e Estados Unidos vêm ocorrendo um processo de revalorização do campo muito mais intenso que no Brasil, observado por uma nova divisão social do trabalho bem distantes da produção agrícola como o ecoturismo, o turismo de aventura, entre outras relacionadas a prestação de serviços dinamizando o campo e diversificando suas atividades.


COMENTÁRIO

O texto faz uma análise do espaço rural levando em conta o papel das cidades tendo em vista que os dois espaços, o rural e o urbano, só podem ser entendidos e analisados conjuntamente, pois fazem parte de uma totalidade indissociável onde a cidade é a paisagem construída pelo homem, que embora desenvolva atividades não relacionadas diretamente com a natureza necessita das matérias primas fornecidas por esta e não obstante fornece os insumos e equipamentos necessários para a realização das atividades agrícolas, sobretudo com a modernização da agricultura a partir da metade do século XX. O espaço rural foi tema de análise de diversos estudiosos que tinham como preocupação o estudo do fenômeno rural, sua definição, modernização sofrida nos últimos tempos com a absorção de tecnologias desenvolvidas pelas indústrias e até mesmo a tendência verificada com a valorização dos espaços rurais para o desenvolvimento de atividades diversas daquelas tradicionalmente desenvolvidas como, por exemplo, o turismo rural (de lazer e aventura) e outros serviços relacionados a este meio, enfim a satisfação das necessidades dos cidadãos urbanos que buscam pelas amenidades típicas das áreas rurais. Tal fenômeno é mais avançado nos países desenvolvidos como os estados Unidos e França onde existe inclusive um fluxo de pessoas das cidades para o campo em busca de novas oportunidades ou de uma melhor qualidade de vida. No tocante ao fenômeno rural não podemos esquecer dos movimentos sociais que vêm ocorrendo no campo, sobretudo por demonstrar os impactos sociais provocados pelo capitalismo que embora tenha a cidade como o maior reflexo, desenvolve-se no meio rural com a mudança nas relações de trabalho e na divisão social do trabalho. Nota-se, porém que a divisão social é mais evidente que a divisão social do trabalho entre campo e cidade. Neste movimento verifica-se tanto a recriação de práticas e tradições rurais em espaços liminares nas periferias das cidades, quanto a adoção de valores e padrões de consumo urbanos no campo. A sociedade tal como se estrutura atualmente coloca o campo como subordinado a cidade e as políticas governamentais sempre priorizaram um desenvolvimento setorial e não territorial que integrasse os dois espaços. Surge a necessidade da construção de um novo rural que passa pelo acesso à cidadania de toda a população rurais sendo pontos importantes para que isto ocorra, a emergência das classes subalternas no campo como sujeito políticos, reconhecimento da capacidade dos segmentos rurais de formular suas próprias alternativas de desenvolvimento e ampliação do acesso à informação pelas classes subalternas rurais para que estas possam se situar no mundo criticamente. Com base nisso, a sociedade têm gestado algumas alternativas surgindo novas experiências de luta no campo, nas quais os movimentos sociais têm buscado formas para permanecer na terra afirmando sua territorialidade. Esses novos movimentos sociais em geral propõem novas formas de organização social, ou seja, novas formas de produzir e existir coletiva e socialmente.



Lazer Virtual

     Com base no texto lido e apresentado em sala “Na Metrópole” onde é feita uma análise antropológica do papel do lazer na vida das pessoas como elemento de grande importância na construção da rede social foi desenvolvido este artigo referente ao lazer virtual muito difundido na sociedade contemporânea. Vale lembrar que o autor considera o lazer não como uma válvula de escape como o capital previa para o descanso do trabalhador, mas algo que socializa a massa e onde realmente são tecidas as relações sociais e onde o ser humano pode realmente falar sua língua, porém um imperativo moderno vem limitando esse tempo ao oferecer um novo tipo de lazer que conduz o homem a uma individualização.
     Atualmente o que se presencia no bojo da sociedade é um novo tipo de lazer ligado ao entretenimento virtual onde as pessoas passam horas plugadas/ligadas a procura de diversão e prazer demonstrando a individualização do ser humano e sua aversão ao mundo exterior. O avanço da tecnologia na área de informática permitiu ao homem uma gama de serviços e lazer on-line onde basta possuir um microcomputador com modem e uma linha telefônica para ter acesso aos mais diferentes tipos de serviços e opções de lazer ao alcance das mãos e no conforto de sua casa.
     Entre as opções de lazer virtual disponíveis está a Internet que permite ao usuário navegar pelos mais diferentes sites de entretenimento para assistir filmes, ouvir músicas, os canais de bate-papo, o Orkut, uma espécie de álbum digital onde o usuário pode colocar suas fotos preferidas e seus dados pessoais, além dos jogos on-line. O usuário ao desfrutar do lazer proporcionado pelo mundo digital não compartilha mais os equipamentos coletivos como uma praça onde as pessoas se reúnem para conversar, um café, deixando de realizar experiências significativas e que realmente valem a pena. Claro que não é pretensão dessa afirmativa dizer que o lazer virtual põe em risco o lazer tradicional, apenas conclui que as pessoas dedicam seu curto tempo de folga com este tipo de lazer talvez por comodidade, economia ou até mesmo por esse espaço ser mais receptivo e atraente, estando descansado para o dia seguinte de trabalho.
     Se voltarmos no tempo veremos que o rádio já ocupou seu lugar como lazer ao transmitir músicas, jogos de futebol, radionovelas e notícias, depois vindo a televisão colocando imagem e movimento nas velhas programações do rádio, atraindo ainda mais espectadores. Mais o computador conseguiu reunir tudo em único aparelho colocando inclusive trabalho e lazer no mesmo espaço bastando um clique na tela para a pessoa escolher entre trabalho e lazer.
     A tradicional dicotomia entre trabalho e lazer na era da informática parece não ocupar mais equipamentos diferentes como outrora, e se a função do lazer tradicional é unir a do virtual é individualizar e empobrecer culturalmente o ser humano visto que ele executa o mínimo de ícones possíveis e o programa já apresenta os resultados esperados, além do que ele não precisa nem pensar, nem ao menos refletir, pois cada idéia se encontra em um lugar sem haver choques entre elas, ao contrário de uma conversa que há opiniões divergentes e que a pessoa precisa exercitar sua argumentação e assim cumpre-se a função do capital que é a alienação do trabalhador.

Resenha sobre o filme: Cidade: da Aldeia a Megalópole

Pela primeira vez na história há mais pessoas vivendo nas cidades do que no campo. É com esta afirmativa que inicia o filme demonstrando o peso das cidades na atualidade e como as pessoas se tornam cada vez mais urbanas ou dependentes da sociedade urbano-industrial.
O filme traça a evolução das cidades desde a Antiguidade como é o caso da cidade localizada entre o Rio Tigre e Eufrates na Mesopotâmia formada há 5000 anos, da cidade de Roma ou a que se localizava na atual cidade do México até os dias atuais com o auge do desenvolvimento urbano, as Megalópoles.
As cidades antigamente surgiam por três razões: por confluência de rotas comerciais, por sediar um Reino ou pelo relevo propício.
Já se referindo as cidades contemporâneas à primeira perspectiva apontada em relação é sua identidade, algo particular que cada cidade carrega seja pela sua história, forma característica ou função desempenhada seja a nível local, regional, nacional ou mundial.
Outra perspectiva é a da cidade escondida e sua infra-estrutura subterrânea, onde é citado o exemplo da megalópole londrina onde sob as ruas de Londres passam inúmeros cabos de eletricidade, telefone, fibra ótica, canalização de água, gás, tubulação de esgoto, e por fim a linha de metrô.
É elucidado que quando um londrino abre a torneira não pensa na infra-estrutura necessária para levar água até a sua residência ou quando aciona o interruptor o fabuloso sistema elétrico operante, tampouco quando aciona a descarga aonde vai parar os dejetos eliminados.
                A este respeito o principal problema enfrentado pela cidade de Londres foi o destino de seus dejetos primeiramente sendo despejado em cursos de água como o Rio Tâmisa provocando uma epidemia de cólera. Para contornar o problema o esgoto passou a ser tratado com a utilização de produtos químicos diminuindo o efeito da cólera e tornando o rio um caldeirão tóxico. Por último criou-se a estação de tratamento totalmente orgânica revitalizando o Rio Tâmisa. Há pelo menos 50 anos não se vê esgoto no rio Tâmisa.
Em outro momento o filme revela que a superpopulação ou aglomerações urbanas sempre foi fator de geração de pestes no decorrer da história, com a Revolução Industrial as cidades passaram a crescer absurdamente atraindo grande contingente populacional. Não há dúvida que a Revolução Agrícola é que possibilitou o desligamento de parte da população para outras atividades tipicamente urbanas iniciando o crescimento das cidades com o desenvolvimento do artesanato, mas a política industrial de expulsão dos camponeses para formar o exército de operários necessário ao desenvolvimento da indústria alavancou o crescimento das cidades, com isso a cidade passou a ser mais do que nunca o centro da vida humana.

O caso de Portland

                Nos Estados Unidos com o crescimento das cidades houve grande investimento na rede de transportes com o incentivo ao uso do veículo particular por ser do interesse da indústria automobilística e de toda a rede de serviços vinculadas a este ramo. O trânsito se tornou um caos principalmente nos centros urbanos, foram criadas auto-estradas por todo o país para facilitar o deslocamento dos veículos. Portland seguiu um outro paradigma, o uso do transporte coletivo, o prefeito na época enfrentou várias resistências, mas por fim provou que esse era o caminho mais indicado.

O caso de Brasília

                Brasília foi uma cidade planejada com o propósito de mudar a capital para o centro do país e desenvolver desta forma o interior pouco habitado até então. Brasília foi o exemplo da forma que superou a função com sua infra-estrutura urbana altamente planejada não pensou no seu uso pelo homem. Ela foi construída no formato de um avião totalmente dividido por setores, o setor residencial para os burocratas, o de diversão, o bancário, o setor das tomadas de decisões e assim por diante. O plano piloto previa ainda as cidades satélites, mas aponta que embora sem infra-estrutura as favelas se tornaram mais humanas do ponto de vista da forma do que Brasília.

Resenha Bibliográfica: CAPITALISMO E URBANIZAÇÃO

IDENTIFICAÇÃO DA REFERÊNCIA

Título: Capitalismo e Urbanização
Autora: Maria Encarnação Beltrão Spósito
Editora: Contexto, 2000, São Paulo, 10ª edição.
Coleção: Repensando a Geografia


IDÉIAS PRINCIPAIS

1. A Urbanização Pré-Capitalista

A realização de um resgate histórico nos períodos Paleolítico, Mesolítico e Neolítico para entender a formação das aldeias, forma embrionária das cidades.

Fatores necessários para a existência das cidades: embutida na origem da cidade há uma outra diferenciação, a social: ela exige uma complexidade de organização social só possível com a divisão do trabalho.

As condições necessárias para a constituição da cidade:
- Criação de instituições sociais;
- Uma relação de dominação e de exploração;
- Uma sociedade de classes.

As cidades na Antiguidade: A explicação para a origem do urbano está no social e no político.

O papel dos impérios na Urbanização, a cidade como centro de poder.

O Feudalismo e desestruturação da rede urbana, um retrocesso na urbanização que vinha se processando.

2. A Urbanização sob o Capitalismo

O Renascimento Urbano e a conformação da urbanização sob o modo de produção capitalista (Capitalismo Mercantil).

A cidade como espaço de suma importância, e a urbanização como processo expressivo e extenso a nível mundial a partir do capitalismo.

O processo de retomada da urbanização, do renascimento das cidades, foi possível pela reativação do comércio, enquanto atividade econômica urbana. Ao se desenvolver, esse comércio foi criando as condições para a estruturação do modo de produção capitalista e, simultaneamente, a destruição dos pilares da economia feudal (o latifúndio, sua economia fechada e a servidão).

O papel dos Estados Nacionais Absolutistas (a urbanização moderna): Grande reforço do processo de urbanização. Este reforço decorreu do fim do monopólio feudal sobre a produção alimentar e do fim do monopólio sobre a produção manufatureira, estimulando as manufaturas e enfraquecendo as corporações de ofício que limitava a produção. Além do mais a formação dos Estados Nacionais Absolutistas permitiu o adensamento populacional na medida em que o aparato político-administrativo que dava amparo ao Estado propiciou o aparecimento de uma burocracia numerosa e a formação de exércitos permanentes.


3. Industrialização e urbanização

Capitalismo Industrial ou Concorrencial: Foi grande o impulso tomado pela urbanização a partir do pleno desenvolvimento da industrialização, pois a cidade era efetivamente o espaço de produção.

A emergência do trabalho assalariado, a última fase para o pleno desenvolvimento do capitalismo.

A Revolução industrial e o desenvolvimento da maquinofatura, o papel preponderante da indústria na economia e na produção das riquezas.

Os problemas urbanos decorrentes da industrialização e da livre iniciativa que o Estado só passaria a controlar mais tarde com a dominação do caos e do comprometimento dos interesses capitalistas.

4. Urbanização e Capitalismo Monopolista

A cidade é particularmente o lugar onde se reúnem as melhores condições para o desenvolvimento do capitalismo. O seu caráter de concentração, de densidade viabiliza a realização com maior rapidez do ciclo do capital, ou seja, diminui o tempo entre o primeiro investimento necessário a realização de uma determinada produção e o consumo do produto.

A deslocalização-desdobramento-internacionalização do capital (multinacionalização das empresas), articulação entre os lugares a nível não apenas regional ou nacional, mas agora transnacional.

A produção das cidades e o desenvolvimento desigual como reflexo desta fase do capitalismo, ao mesmo tempo em que o capital homogeneíza a aparência das cidades ele diversifica as suas funções através da divisão do trabalho, ou seja, a sua essência.

O papel das Metrópoles na reprodução capitalista.


COMENTÁRIO

1.  A Urbanização Pré-Capitalista

Já durante o paleolítico o homem embora não tivesse moradia fixa passou a se relacionar com o lugar através de encontros e cerimônias. No mesolítico ele já se sedentarizou cultivando plantas e domesticando animais na chamada revolução agrícola. No neolítico foi marcado pela vida mais estável nas aldeias. Então cabe ressaltar que no neolítico já havia realizado a primeira condição para o surgimento das cidades faltando a segunda que é a organização social mais complexa com a divisão do trabalho. O excedente de alimentos é a condição necessária para a divisão do trabalho desligando parte da população da produção agrícola e se dedicando desta forma a outras atividades originando as cidades além de uma segunda condição que é a criação de instituições sociais, uma relação de dominação e exploração além de uma sociedade de classes, revelando a participação diferenciada dos homens no processo de produção, distribuição e apropriação de riquezas. As cidades na antiguidade já demonstravam um caráter urbano e sua explicação está no social e no político, pois além de sediar a estrutura administrativa, possuíam uma divisão do trabalho, que se traduzia na constituição de uma estrutura de classes. Os Impérios tiveram papel importante na urbanização da Europa porque aumentaram o número de cidades para manterem a supremacia militar, através de sua ampliação estenderam o urbano pela Europa provocando transformações econômicas, sociais e políticas, além de acentuarem a divisão social do trabalho e a complexidade da organização política necessária a sustentação do Império provocando a ampliação dos papéis urbanos e o aumento do relacionamento entre as cidades. Com a queda do Império Romano houve um declínio no processo de urbanização ocorrendo uma desestruturação da rede urbana que havia se desenvolvido sob a hegemonia do poder político centralizado. Os pontos que marcaram a organização social e a urbanização na Antiguidade foram: a divisão social do trabalho e a formação da sociedade de classes, as cidades cumpriam o papel de espaço de dominação política e sede de instituições, aumento das cidades pela capacidade de produção devido ao desenvolvimento técnico alcançado, o desenvolvimento da escrita importante na dominação política e social. A Idade Média foi marcada por uma nova organização econômica, social e política com o enfraquecimento do papel das cidades e o esfacelamento do poder central com o fim do comércio de longa distância devido ao controle dos árabes sobre o Mediterrâneo, imprimindo de vez o caráter agrário a Europa Ocidental. No feudalismo a terra passa a ser a única fonte de subsistência e de condição de riqueza, a economia exclusivamente agrícola e intrafeudo esvaziou definitivamente o urbano de seu papel econômico e político.

2.  A Urbanização Sob o Capitalismo

A cidade nunca fora um espaço tão importante e nem a urbanização um processo tão expressivo e extenso a nível mundial como a partir do Capitalismo justamente por ser a sede das manufaturas e do comércio e onde são realizadas as atividades adiministrativas que dão suporte ao seu desenvolvimento. No decorrer dos séculos X e XI houve a reabertura dos portos europeus, antes sob o controle árabe dando um grande salto no comércio e na produção de manufaturas. Com o renascimento comercial houve o crescimento e a complexificação da estrutura urbana. O comércio enquanto atividade urbana, além de retomar a urbanização, foi criando as condições para a estruturação do modo de produção capitalista e simultaneamente a destruição dos pilares da economia feudal. Foi nesta primeira fase do desenvolvimento do novo modo de produção que ocorreu a acumulação primitiva do capital imprescindível para o desenvolvimento mais tarde do capitalismo industrial. Porém para o desenvolvimento do comércio a burguesia comercial se viu entre duas barreiras, por um lado à organização corporativista dos artesãos que limitava a produção de mercadorias e por outro o monopólio sobre o excedente alimentar pela aristocracia feudal. Para solucionar este problema a burguesia passou a organizar no campo outra produção artesanal para dar conta da demanda, os comerciantes passaram a fornecer matérias-primas e ferramentas as famílias camponesas liberadas corroendo desta forma o sistema servil. A organização no campo foi possível, pois a regulamentação corporativa se restringia a área urbana. Em resumo, o que se deu a partir da manufatura foi a especialização e o aprofundamento da divisão do trabalho e os primeiros passos para a emergência do trabalho assalariado. A aliança da burguesia com o rei permitiu a formação dos Estados Nacionais Absolutistas que possibilitou o desenvolvimento da urbanização com o fim do monopólio feudal sobre o excedente alimentar transformando a terra em mercadoria que era por vezes arrendada ou vendidas, além de expandir a produção de manufaturas com o fim das leis que protegiam as corporações. Com a formação dos Estados Nacionais permitiu-se o adensamento populacional pela formação de uma burocracia estatal e a formação de exércitos permanentes, além da formação da corte, de instituições e do desenvolvimento do artesanato de luxo e das artes. Os Estados Nacionais empreenderam também as grandes navegações marítimas dando reforço a economia mercantil muito importante para o processo de urbanização além de estender a urbanização ao mundo colonial a partir do século XV. A cidade mercantil era também o espaço de dominação e gestão do modo de produção, de exercício do poder, e fornecedora de serviços além de assumir o caráter produtivo sendo o lugar de produção de mercadorias.

3. Industrialização e Urbanização

A urbanização antecede a industrialização, embora esta tenha colaborado decisivamente para o desenvolvimento urbano, a cidade desta forma passou a ser um espaço efetivamente de produção. A expressão industrialização usada correntemente trata-se, pois de um processo bem mais amplo do que a mera transformação de matérias-primas em mercadorias se referindo a transformação mais radicais tanto de ordem social, quanto econômica e política. Dado o caráter urbano da produção industrial (produção esta totalmente diferenciada das atividades produtivas que se desenvolvem de forma extensiva no campo, como a agricultura e a pecuária) as cidades de tornaram sua base territorial, já que nelas se concentram capital e força de trabalho. Na primeira etapa do capitalismo ele fora denominado capitalismo comercial passando posteriormente a denominar-se capitalismo industrial, mas para entender como este capitalismo se desenvolveu é fundamental apreender como se dá a emergência do trabalho assalariado: No começo a produção artesanal era doméstica sendo o artesão proprietário dos meios de produção e realizando todas as fases da produção, num segundo momento surgiram as corporações de ofício para proteger os interesses dos produtores, posteriormente os artesãos passaram a receber encomendas sendo fornecido a eles as matérias-primas e as ferramentas e recebendo um valor determinado par isso. Desta forma o trabalho assalariado entra em processo de gestação. A partir da segunda metade do século XVII, aperfeiçoaram-se os instrumentos de produção. As ferramentas e algumas máquinas (ainda que movidas pela energia humana) melhoram e tornaram-se mais caras, o que acabou por fortalecer o controle da produção, por parte daqueles que tinham capital acumulado e podiam fazer frente a estes investimentos. As transformações que colaboraram para o trabalho assalariado: o fim das terras comuns para pastagens, elevação das taxas de arrendamento em decorrência da transformação definitiva da terra em mercadoria, ou seja, em fonte de renda, o aumento das taxas de crescimento populacional também permitiu o a ampliação do contingente de expropriados. O início da industrialização entendida aqui como traço da sociedade contemporânea, como principal atividade econômica e principal forma através da qual a sociedade se apropriava da natureza e a transformava marcou de forma profunda e revolucionou o próprio processo de urbanização. Foi grande o impulso tomado pela urbanização a partir do pleno desenvolvimento da industrialização, certamente essa urbanização correspondeu a movimentos migratórios campo-cidade, decorrentes de mudanças estruturais no campo nos séculos anteriores, face ao desenvolvimento capitalista, que deu as cidades uma capacidade produtiva maior. As cidades comerciais demonstraram ser um bom lugar para o desenvolvimento industrial, a indústria absorve os centros urbanos já importantes nos fins do século XVII e durante o século XIX predominantemente em alguns setores como, por exemplo, os da indústria gráfica e de papel, ambas já desenvolvidas de forma artesanal nas grandes cidades comerciais. Contudo houve no mesmo período, uma tendência a localização industrial fora das cidades, principalmente em setores como o da metalurgia, cujo interesse era grande em estar próximo as fontes energia. A divisão territorial do trabalho tornou-se efetiva e possível a partir do desenvolvimento das comunicações dos transportes permitindo a circulação de pessoas e mercadorias dando suporte ao sistema capitalista. Um dos resultados concretos da articulação entre os lugares que permitiu a constituição da rede urbana, foi a interdependência entre as cidades, que provocou, ao longo do tempo, a subordinação de umas as outras, ao que se deu o nome de hierarquia urbana. Os centros urbanos passaram a sediar as indústrias atraindo uma massa de trabalhadores que passaram a morar no centro em casarões antigos que eram divididos por várias famílias transformando-se em cortiços sem a mínima higiene, esses casarões foram abandonados pelas elites que procuram na periferia um lugar de amenidades e qualidade de vida provocando a separação espacial das classes sociais dentro das cidades. O liberalismo, como referencial ideológico, a livre concorrência e a iniciativa privada sem intervenção do poder público, como princípios de conduta, e a busca de reprodução do capital a todo custo, transformaram especialmente as cidades inglesas do século XIX em espaços caóticos. Esta desordem não pode perdurar por muito tempo porque começou a incomodar até mesmo os mais ricos. O Estado passou a interferir no planejamento das cidades estabelecendo regulamentos e executando obras.

4. Urbanização e Capitalismo Monopolista

A medida que o desenvolvimento técnico e o capital investido em um determinado setor industrial tornavam-se maiores, permitiam que os capitalistas e/ou países que contavam com largas fatias do mercado reforçassem suas posições e inviabilizassem a entrada de outros capitalistas e/ou países nesta concorrência. Com a deslocalização-desdobramento-internacionalização do capital a produção diferenciada entre as regiões/países provoca um desenvolvimento desigual entre estes lugares, embora articulado entre si, que se manifesta numa urbanização com estes mesmos traços. A produção capitalista homogeneíza as paisagens e os hábitos no tocante a aparência não confundindo a homogeneização dos lugares, ou seja, a essência. A produção espacial como manifestação clara do capitalismo avançado traduz-se em pelo menos três formas diferentes: a primeira é a existência de grandes unidades de produção e consumo, o resultado é a descentralização espacial das unidades de produção. A segunda é a ampliação da massa de assalariados acompanhada de uma diversificação de níveis de hierarquização no próprio interior da categoria social concretizando no urbano na diferenciação dos padrões de habitação. Em terceiro o capitalismo precisa de uma concentração do poder político, e cria as condições para a formação de uma tecnocracia, apoiada na “competência” dos especialistas, que a nível das cidades produz uma planificação urbana sem particularismos, os programas nacionais. O crescimento urbano acelerado devido às taxas de crescimento natural e migração rural-urbana manifestam-se na formação de uma rede urbana marcada por uma superconcentração populacional e de investimentos capitalistas nos maiores aglomerados urbanos gerando a constituição de grandes metrópoles permitindo verificar o grau de supremacia populacional de algumas metrópoles como a área metropolitana de Montevidéu que na década de 70 concentrava 41,7 % da população ou a de São Paulo que na década de 80 concentrava 10,8 % da população, pois é na metrópole que se cria à infra-estrutura necessária a reprodução capitalista.


O PAPEL DOS SERVIÇOS PÚBLICOS E DO TURISMO NA INSERÇÃO DE FLORIANÓPOLIS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO E NA SUA FORMAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL

            Qualquer lugar do planeta está inserido no mundo contemporâneo ou globalizado, pois mesmo que o lugar não aceite esse novo sistema ou ele não se integre totalmente assim mesmo o lugar já se conectou seja por via da ação/reação ou das influências recebidas. Isto implica dizer que a relação de forças dicotômicas entre o velho e o novo sistema ou a tentativa de imposição faz a conexão entre o lugar e o novo modelo que se apresenta, pois são estabelecidos fluxos que mesmo não aceitos tampouco integrados totalmente permeiam todo o lugar deixando traços característicos do novo.
            É verdade afirmar que nem todo lugar é inserido de forma homogênea no novo contexto, ou seja, no mundo globalizado, pois nem todo lugar apresenta as condições necessárias para a inserção do novo modelo, tendo em vista que existem as reações específicas de cada lugar, tanto do lado social, representado pelo seu interesse em aceitar o novo ou o próprio interesse do novo, através de seus agentes, em integrar-se ao lugar representado pelas potencialidades requeridas ou do próprio ambiente natural que o lugar possa oferecer.
            Florianópolis tem suas especificidades e determinações, seja por suas riquezas paisagísticas, por sua condição de ilha, por ser a capital, por sua colonização açoriana ou pelo fluxo de pessoas vindas de todas as partes do Brasil e do exterior, além de ter uma formação sócio-espacial particular apesar da tentativa de massificação do modo de produção capitalista.
Com base na situação de centro político-administrativo e no desenvolvimento do turismo, sobretudo a partir da década de 70, é que traçaremos um panorama da cidade, sua inserção e a função desempenhada no mundo contemporâneo.


A INSERÇÃO DE FLORIANÓPOLIS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

            A inserção de Florianópolis no mundo contemporâneo globalizado teve sem dúvida a contribuição da superestrutura política por ser a capital do estado e sediar toda a estrutura estatal, no ramo de serviços, seja pela administração direta como também através dos mais diferentes órgãos governamentais e pelas empresas públicas, das instituições de ensino como a UFSC, a UDESC, o CEFET, além de toda a estrutura legislativa e judiciária, possibilitando a visão de como a estrutura Federal, Estadual e Municipal estão inseridas neste lugar com toda a sua superestrutura e infra-estrutura econômica formando e dinamizando a formação econômica e social do lugar possibilitando ainda através da massa de servidores públicos a sustentação de um comércio diversificado e com vigor para atender toda esta demanda instalada, aliada a isso o ambiente natural propício ao turismo verificado pelas inúmeras praias principalmente do norte da ilha que abarca 40% da população da cidade.
            Ao ser sede do governo estadual e dos órgãos federais, a cidade foi inundada por uma massa crescente de funcionários públicos, se tornando inclusive centro irradiador atraindo desta forma todos os tipos de interesse econômico particulares seja no ramo da saúde como clínicas e laboratórios, na educação com escolas, faculdades e institutos de pesquisa e desenvolvimento, na administração, segurança e conservação patrimonial, no ramo de serviços contábeis, jurídicos, arquitetônicos, de planejamento atraindo um grande contingente de firmas e homens em busca de oportunidades. Claro que todo esse contingente populacional em contraposição não deixaria de formar as favelas que fazem parte da paisagem florianopolitana, pois o sistema necessita e absorve, embora de forma precária, também a mão-de-obra pouco ou não qualificada tendo em vista que o comércio, o turismo, a construção civil e o ramo de serviços na área de segurança e conservação patrimonial se apóiam nesta classe da população que produzem, consomem, utilizam os serviços públicos essenciais e fazem a engrenagem social se movimentar, além do sentimento de aversão e ao mesmo tempo de pertencimento do habitante local, muito bem utilizada pelos dirigentes locais com a criação por exemplo da figura do manezinho, que não obstante vê essa invasão que nada melhora sua vida, além de aumentar seu custo de vida
             Florianópolis atrai várias pessoas por ser, entre outros fatores, uma cidade média para os padrões de grandes centros urbanos como São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre que fogem do tumulto e da saturação do mercado, dos vizinhos do Mercosul pelas vias do turismo e demais estrangeiros enfeitiçados pela propaganda promovida pelas elites políticas locais e pelas oportunidades vislumbradas.
           

O PAPEL DO SETOR TERCIÁRIO
           
            O setor terciário é o mais significativo em Florianópolis e não poderia ser diferente, pois sendo a capital naturalmente os serviços públicos dominariam a estrutura econômica dando enorme impulso ao comércio de bens de consumo, aliado a isto estão os serviços de caráter privado que pela dinâmica da economia e da estrutura urbana, além do alto poder aquisitivo da população permeiam toda a economia nas mais diferentes áreas nos ramos da educação, saúde e segurança.
            Além de ser a capital, a cidade é detentora de belas paisagens naturais, aliada ao investimento em infra-estrutura à ilha de Santa Catarina tem no setor de turismo uma de suas bases econômicas atraindo turistas de várias partes do mundo projetando Florianópolis no cenário internacional. Por outro lado, está em voga o turismo de eventos como reuniões e simpósios empresariais, eventos artístico-culturais como apresentações teatrais, shows, eventos esportivos como, por exemplo, a etapa mundial de Surf do WCT (Etapa do Mundial de Surf) na praia da Joaquina, o Ironman, corridas automobilísticas, entre outros.
Um dado importante é quanto a participação dos serviços no PIB do município que corresponde a 75 % ou seja, 1.844,45 milhões contra 608,99 milhões do setor industrial no ano de 2003 segundo dados por município do IBGE, enquanto o setor de serviços representa em São José 57%, Palhoça 53% e Biguaçu 49% sempre para o mesmo ano, demonstrando com o setor terciário representado pelos serviços, comércio e turismo são significativos em Florianópolis.
O turismo em Florianópolis começou efetivamente a partir da década de 70 com a realização de obras de infra-estrutura por parte do governo e o apoio da elite local interessada no lucro que essa atividade geraria. Em pouco tempo a capital apresentou um grande crescimento populacional com a chegada de pessoas de várias partes do Brasil e do exterior interessadas em investir, trabalhar, morar ou apenas visitar no período de verão atraídas pela propaganda que era feita da ilha e, sobretudo pela possibilidade de ganhos. Claro que o setor de turismo não foi o único atrativo visto que a capital centraliza os serviços públicos, as empresas públicas e duas universidades governamentais como já foi mencionado.
Com a chegada desse contingente de pessoas foi alavancada a “indústria do turismo” com o estabelecimento de empreendimentos turísticos, valorização imobiliária, principalmente na orla marítima provocando degradação ambiental e a retirada dos meios de vida do habitante local que retirava seu sustento do mar, seja pela compra do seu imóvel, privatização das praias ou pela poluição das águas tendo em vista que o poder público passou a dar atenção especial aos grandes investidores em detrimento do pescador/agricultor.
Anteriormente ao avanço do turismo, a capital catarinense já tinha sido palco de diversas alterações a partir da década de 60, entre elas, está à formação de um grande contingente de funcionários públicos e de estudantes que chegaram a cidade com a instalação de órgãos estaduais e federais como a Eletrosul, a Universidade Federal de Santa Catarina, a construção de novas pontes ligando a ilha a parte continental, a construção da BR 101, aproximando Florianópolis dos estados do Sul e do restante do Brasil, e a interligação definitiva do litoral a região oeste catarinense através da BR 282. Tudo isso permitiu um rápido desenvolvimento e criação de uma imagem externa da capital catarinense como uma cidade progressista e ao mesmo tempo bonita e receptiva.
Só para se ter uma idéia na capital havia em 1970, de acordo com dados do IBGE, pouco mais de 143 mil habitantes, número que subiu para 331 mil em 2000 e chega a 385 mil em 2006.


A REGIÃO METROPOLITANA

            Florianópolis, por ser a capital e pelo seu vigor econômico se torna centro irradiador contribuindo de maneira significativa para o desenvolvimento de municípios como São José, Palhoça e Biguaçu que tem no setor industrial uma de suas bases econômicas mais desenvolvidas, representando 41% do PIB em São José e Palhoça e 43% em Biguaçu, segundo dados de 2003 do IBGE. Tal desenvolvimento foi possível por estarem situadas ao lado de Florianópolis, apresentarem terrenos mais baratos para este fim, investimentos públicos na criação dos distritos industriais com infra-estrutura pela sua localização as margens da BR 101 como também o desenvolvimento populacional e em contrapartida da construção civil tendo em vista que as pessoas e empresas encontraram terrenos bem mais baratos nestes municípios.
            Florianópolis, São José, Palhoça e Biguaçú formam a região conurbada da Grande Florianópolis com uma população aproximada de 750 mil habitantes e uma produção econômica na ordem de 6 bilhões de reais no ano de 2003.
Sendo Florianópolis a capital e sede dos órgãos federais recebeu investimentos em infra-estrutura que deveria em tese ser responsabilidade do município dinamizando a estrutura urbana do lugar possibilitando o seu crescimento a reboque da estrutura político-administrativa do estado e da união, além de receber diversas pessoas de várias partes do Brasil.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Cabe ressaltar que o mundo contemporâneo teve início com o modo de produção capitalista e que fatalmente Florianópolis estaria inserida não só por ser sede do governo estadual e dos órgãos federais, bem como receptora de investimentos de outros estados e até internacionais além do recebimento de milhares de turistas todos os anos, mas sim porque todo o lugar do mundo está inserido passiva ou ativamente, total ou parcialmente tendo em vista que o meio técnico científico informacional se encarregou disso. A influência da estrutura econômica já está em todo lugar, em todos os continentes e até mesmo na sociedade mais tradicional como a indígena ou a dos esquimós e até no mais simples homem da terra nem que seja sofrendo as conseqüências da estrutura política e econômica e da inserção global no mundo contemporâneo.      
            É necessário salientar que Florianópolis foi inserida no cenário mundial não somente por ser a capital, mas por ser sede dos órgãos federais, bem como pelo turismo, facilitado pelas condições naturais e investimento em infra-estrutura por parte do governo do estado, além de receber inúmeros investimentos privados e pessoas de outras partes do Brasil e do exterior nas áreas da saúde, da educação, tecnologia, serviços contábeis e jurídicos configurando um mosaico étnico e uma formação social bastante diversificada e ao mesmo tempo específica.
            Florianópolis não ficou somente desempenhando a função de capital, pela possibilidade através das condições naturais, alavancou o desenvolvimento do turismo lançando inclusive as bases para o desenvolvimento do turismo de eventos, além de ter se tornado pólo da indústria de tecnologia possibilitado pela estrutura econômica e da construção civil devido ao forte crescimento urbano verificado, sobretudo nas últimas décadas.

* O ramo tecnológico é o primeiro em Florianópolis sendo que o turismo, comércio de demais serviços ficam atrás.

FONTES CONSULTADAS

SOUZA, Maria Adélia Aparecida de. Conexões Geográficas: Um ensaio metodológico. Boletim Paulista de Geografia, nº 71.

SANTOS, Milton. Espaço & Método. São Paulo: Editora Nobel, 1985.

SANTOS, Milton. Sociedade e Espaço: a formação social como teoria e como método. Antípode, nº. 01, 1977.

SILVA, Adriano Larentes da. Migrações Contemporâneas e Construção de identidades em Florianópolis/SC. Artigo Acadêmico, 2000.

OURIQUES, Helton Ricardo. Turismo em Florianópolis: Uma crítica à “Indústria Pós-Moderna”. Editora da UFSC, Florianópolis, 1998.

IBGE. Dados por município de Santa Catarina. Disponível em <www.ibge.gov.br>